Primeiro-ministro da Irlanda, Enda Kenny, e o diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, padre Federico Lombardi
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"Trata-se de um documento estruturado com clareza, de modo a afrontar todas as questões levantadas, e dar respostas argumentadas e documentadas, inserindo-as em uma perspectiva de amplitude adequada", explica o diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, padre Federico Lombardi.
A resposta da Santa Sé foi solicitada pelo vice-primeiro-ministro (Tánaiste) e Ministro para Assuntos do Exterior e Comércio da Irlanda, Eamon Gilmore, em 14 de julho deste ano, durante encontro com o Núncio Apostólico no país, Arcebispo Giuseppe Leanza.
"Reconhecendo a seriedade dos crimes detalhados no Relatório, que jamais deveriam ter acontecido na Igreja de Jesus Cristo, e desejando responder à solicitação do governo da Irlanda, a Santa Sé, depois de cuidadosamente examinar o Relatório Cloyne e considerar as muitas questões levantadas, procurou responder de forma abrangente", ressalta um boletim divulgado pela Sala de Imprensa da Santa Sé.
O documento foi entregue pelo subsecretário para as Relações com os Estados, monsenhor Ettore Balestrero, àChargé d’Affaires da Embaixada da Irlanda junto à Santa Sé, Helena Keleher, na manhã deste sábado.
"Todo o documento demonstra como a Santa Sé levou em consideração com grande seriedade e respeito os questionamentos e críticas recebidas, e se empenhou em dar uma resposta aprofundada e serena, privada de inúteis tons polêmicos também lá onde dá respostas claras às acusações que lhe foram feitas. Esperamos, portanto, que isso chegue ao escopo fundamental e de comum interesse que se propõe: contribuir para reconstruir aquele clima de confiança e de cooperação com as autoridades irlandesas, essencial para um compromisso eficaz da Igreja e de toda a sociedade para garantir eficazmente o bem primário da salvaguarda da juventude", complementa padre Lombardi.
Resposta
O texto da resposta aponta que a publicação do Relatório Cloyne significa "um passo a mais no longo e difícil caminho de comprovação da verdade, de penitência e purificação, de cura e renovação da Igreja na Irlanda. A Santa Sé não se considera alheia a esse processo, mas o compartilha em espírito de solidariedade e compromisso".
Da mesma forma, reafirma a profunda repugnância da Santa Sé com relação aos delitos acontecidos, que "lamenta e se envergonha profundamente pelos terríveis sofrimentos que as vítimas e suas famílias tiveram que suportar na Igreja de Jesus Cristo, lugar onde isso jamais teria que ocorrer".
De todo modo, a atitude adotada pela Igreja na Irlanda em tempos recentes com relação ao problema do abuso sexual de menores "se está beneficiando da experiência em curso e demonstrando cada vez maior eficácia na prevenção da repetição de tais delitos e no trato dos casos que surgem".
Com relação ao duro discurso do primeiro-ministro (Taoiseach) da Irlanda, Enda Kenny, pronunciado na Câmara dos Deputados (Dáil Éireann) em 20 de julho de 2011, a Santa Sé salienta que compreende e compartilha os profundos sentimentos de tristeza e frustração diante das conclusões do Relatório Cloyne. "No entanto, mantém importantes reservas sobre alguns aspectos do discurso. Em particular, é infundada a acusação de que a Santa Sé pretendesse 'frustrar uma Investigação em uma República soberana e democrática há somente três anos, não há três décadas'. Além disso, um porta-voz governamental, quando questionado a respeito, esclareceu que o senhor Kenny não se referia a nenhum incidente específico".
A Santa Sé indica que as acusações de interferência em assuntos internos do Estado irlandês caem por terra por falta de provas. Da mesma forma, não há como sustentar a tese de ingerência na gestão ordinária das dioceses ou congregações irlandesas com relação aos problemas de abuso sexual.
"O fato é que não existe base para tais acusações. A esse respeito, a Santa Sé deseja deixar bem claro que de nenhum modo obstaculizou ou tentou interferir em nenhuma investigação de casos de abuso sexual de menores na Diocese de Cloyne. Da mesma forma, em nenhum momento a Santa Sé tentou interferir na lei civil irlandesa ou impedir as autoridades civis no exercício de suas funções", explica a resposta.
No entanto, ao mesmo tempo em que rechaça as acusações infundadas, a Santa Sé "acolhe com espírito de humildade todas as observações e sugestões objetivas e úteis para combater com determinação ao espantoso delito do abuso sexual de menores".
A parte final da resposta indica claramente a posição da Igreja:
"A Santa Sé deseja manifestar novamente que compartilha a profunda preocupação e inquietude expressadas pelas autoridades irlandesas, pelos cidadãos irlandeses em geral e pelos bispos, sacerdotes, religiosos e leigos da Irlanda em respeito aos atos delitivos e pecaminosos de abuso sexual perpetrados por membros do clero e por religiosos. A Santa Sé é também consciente da compreensível raiva, desilusão e do sentimento de traição experimentados por quem, particularmente as vítimas e suas famílias, viram-se afetados por essas ações vis e deploráveis e pelo modo que, às vezes, se afrontaram por parte das autoridades eclesiásticas. E, por isso, a Santa Sé deseja reiterar sua dor pelo sucedido. Deseja que as medidas que a Igreja introduziu nos últimos anos, universalmente, como também na Irlanda, sejam mais eficazes para prevenir a repetição de ditos atos e contribuam para a cura de quem sofreu os abusos e a restabelecer a confiança recíproca e a colaboração entre as autoridades eclesiásticas e as estatais, o que é essencial para lutar eficazmente contra o flagelo do abuso. Naturalmente, a Santa Sé sabe bem que a dolorosa situação provocada pelos episódios de abuso não pode se resolver rápida ou facilmente e que, embora se tenham realizado muitos progressos, resta ainda muito por fazer.
Desde os primeiros dias do Estado irlandês, e especialmente desde o estabelecimento de relações diplomáticas, em 1929, a Santa Sé sempre respeitou a soberania da Irlanda, manteve relações cordiais e amistosas com o país e suas autoridades, frequentemente expressou sua admiração pela extraordinária contribuição de homens e mulheres de Irlanda à missão da Igreja e à melhoria das condições de vida de populações de todo o mundo; além disso, a Santa Sé não poupou esforços para promover a paz na ilha durante as últimas atormentadas décadas. Em sintonia com tal atitude, a Santa Sé deseja reafirmar uma vez mais seu compromisso em dialogar construtivamente e cooperar com o Governo irlandês, diálogo e cooperação que naturalmente devem basear-se no respeito mútuo, de forma que todas as instituições, tanto públicas quanto privadas, religiosas ou civis, trabalhem juntas para assegurar que a Igreja, mais ainda, a sociedade em geral, seja sempre um lugar seguro para a infância e os jovens".
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